5ª EDIÇÃO DA BIENAL SESC DE DANÇA
“Memória que se inscreve”
Para público e artistas, o estranhamento do olhar que se depara com o movimento da dança em locais inusitados da cidade, faz surgir associações e reinterpretações do ambiente, cria novos repertórios e possibilidades de ação do futuro, e, por conseqüência, um referencial para a conduta no presente.
Os mecanismos que fazem dessa produção cultural ser alusiva à propriedade do coletivo, nos direciona a uma idéia de movimento, trocas de informação com a comunidade e expansão das expressões culturais.
É este movimento que direciona a idéia da quinta edição da Bienal SESC de Dança, evento que traz reflexões sobre qualidades diferentes de memória que o corpo inscreve, como a memória de espécie, a memória genética e a memória de linguagem, que além da artística, revela a nossa linguagem, enfatizada através dos gestus social – gestos do cotidiano que pressupõe uma relação histórica, social e econômica reveladora na possibilidade de explorar como são inscritos esses movimentos.
LOCAIS DE REALIZAÇÃO DO EVENTO
Centro Velho:
Bolsa do Café;
Boulevard da Rua XV de Novembro
Praça Mauá.
Orla da Praia:
Pinacoteca;
Praça das Bandeiras;
Praça do Aquário;
Fonte do Sapo (Calçadão da Praia).
Espaços do SESC Santos
Teatro;
Fosso do teatro;
Foyer do teatro;
Convivência;
Estacionamento;
Internet Livre;
Toca.
6 comentários:
Fiquei decepcionado com os grupos convidados. - Mas, ainda tenho esperança em me surpreender (o futuro dirá)AGORA, decepção MAIOR foi o espetáculo de lançamento da BIENAL: "TRANSTORNA" com o Grupo mineiro Palácio das artes. QUE BOMBA FOI AQUILO! FAZIA TEMPO QUE NÃO ASSISTIA ALGO TÃO RUIM (E PRETENCIOSO) ainda tiveram a cara de pau em citar ITALO CALVINO! Foi um horror! Saudades das Bienais passadas! COMEÇOU MUITO MAL, ESPERO QUE MELHORE
Cia de Dança Palácio das Artes está viajando pelo Brasil com o espetáculo TRANSTORNA
A Cia de Dança Palácio das Artes, de Belo Horizonte/MG, acabou de passar por São Paulo, no Panorama Sesi de Dança, com o espetáculo Transtorna e continuará a viajar pelo país.
A estréia foi em Belo Horizonte, em novembro do ano passado e, além de São Paulo, os artistas se apresentaram pelo interior de Minas e por Salvador ("Balé Teatro Castro Alves - 25 Anos de Aplausos").
Transtorna borbardeia o público com criativas visões sobre a nossa
modernidade, que muitas vezes nos desnorteia e distancia as pessoas, mas que também tem seus bons momentos.
As cidades e a obra de Ítalo Calvino serviram de inspiração para a concepção das cenas, criadas em sistema colaborativo pelos bailarinos.
A arquitetura, a política, a economia e suas ressonâncias na natureza e na
construção social fizeram parte dos estudos que envolveram a produção da
montagem. A linguagem corporal dos bailarinos apresenta signos que transmitem com criatividade aspectos da vida urbana. De acordo com o release da montagem, o objetivo é causar reflexão através de desconstruções na relação entre público e artistas, requalificando a dimensão simbólica dos muros, dos vazios urbanos, da supressão do verde e da invisibilidade social, e também a relatividade do tempo, a simultaneidade e a fragmentação, em meio à fragilidade dos corpos.
A união de competentes profissionais é uma das características da Cia, que
certamente está entre as melhores do Brasil.
Não sou especialista em dança, mas os bailarinos e a direção e coreografia
de Cristina Machado estão em tal harmonia que é difícil despregar o olho do
palco.
A trilha, de Daniel Maia, em sua terceira parceria com a Cia (os trabalhos
anteriores foram em Coreografia de Cordel e Sonho de Uma Noite de Verão) dá dinamismo às cenas quando é preciso e realça o silêncio em outros momentos. A iluminação de Domingos Quintiliano complementa com maestria a encenação.
Vídeo e linguagem teatral (suspiros, falas desconexas e cantos contidos) se juntam à trilha sonora e retratam a diversidade urbana.
O cenário coloca os bailarinos em ambientes que realçam o tema da montagem e compreender a representação dos elementos de cena é uma tarefa certamente instigante para o espectador.
O ritmo é lento no começo, remetendo à nossa rotina, mas depois vai ficando deliciosamente alucinante.
Dois momentos merecem destaque, por exemplificarem a magia criativa exposta pela Cia: no início da apresentação, dois atores dançam sobre um compensado vertical e interagem de forma interessante. Outro momento é a presença de diversos caixotes no palco (por entre os quais os bailarinos circulam e correm), que podem representar túmulos, labirintos, prédios, etc.
Alguma dificuldade para o entendimento das cenas pode ocorrer, mas a graça de Transtorna está em fazer o público pensar e não em entregar a ele algo explícito.
Repito uma consideração que fiz sobre coreografia de Cordel, que também é pertinente a Transtorna: não se constituir numa montagem de fácil entendimento é uma qualidade do projeto, na medida em que apresenta ao público a visão de artistas/pesquisadores sobre o nosso país, sobre o nosso povo. Num mundo imediatista como o nosso, produções culturais pautadas pelo estudo e pesquisa merecem respeito.
Quem está acostumado a uma dança mais tradicional precisa se despir de
qualquer preconceito para assistir à deliciosa ¨loucura cênica¨ da Cia de
Dança. O distanciamento entre palco e platéia (a chamada quarta parede) é quebrado com a movimentação dos atores por todo o teatro e com a interação com o público.
Por mais que o nosso cotidiano seja pautado por milhares de informações,
seja nas ruas, através da TV ou até mesmo pela Internet deve ser complicado transformar em linguagem "de dança" as percepções dos bailarinos de nossa realidade, e mais, dar uma certa coesão a essas diferentes percepções do pensar e agir do ser humano. E eles fazem isso muito bem!
Acompanhem a trajetória da Cia de dança PA nos endereços e não deixem de prestigiar aos espetáculos quando os mesmos passarem pela sua cidade.
SOBRE A CIA:
A Cia do Palácio das Artes foi fundada em 1971. Desde então, montou vários espetáculos que obteve sucesso de público e critica, tais como: Coreografia de Cordel, Sonho de Uma Noite de Verão (Fragmentos Amorosos), dirigido por Gabriel Villela (coreografia de Cristina Machado), Poderia ser Rosa (coreografado por Henrique Rodovalho) e Entre o Céu e as Serras ( por Luis Mendonça e Cristina Machado).
Vale ressaltar que o nome usado pela Cia era Cia de Dança de Minas Gerais e foi mudado para Cia de Dança Palácio das Artes em 2004.
No http://www.palaciodasartes.com.br/danca_hotsites.asp?sec_menu=3,1,0&grupo=danca tem link para o site de Transtorna, Coreografia de Cordel, Poderia Ser Rosa e Sonho de uma Noite de Verão - Fragmentos Amorosos.
Logo abaixo é possivel ler os textos de minha autoria referentes aos espetáculos Coreografia de Cordel e Sonho de Uma Noite de Verão, bem como fotos dessas montagens.
Obs: Texto também encontrado no http://www.spiner.com.br/JornalSpiner/
realmente é isso: BOMBARDEIA O PÚBLICO! FOI UMA BOMBA TREMENDA.
Sexta-feira, 9 novembro de 2007
CADERNO 2
Encarnado tece no corpo a trama da violência urbana
Cia. Lia Rodrigues mostra sua obra perturbadora até domingo na cidade
Crítica Helena Katz
Uma dor que fica exposta como o osso que, na fratura, fura a pele. Uma dor pelo lado de fora do corpo. É tão crua essa dor, que a sua secura explode em estilhaços e tais estilhaços vão se fincando em nós. Encarnado, de e com a Lia Rodrigues Companhia de Dança, estreou em novembro de 2005, na França, no CND - Centre Nacional de la Danse, e, exatos dois anos depois, felizmente foi trazido a São Paulo pelo Sesc Paulista.
Difícil deixar clara a importância dessa obra, na qual as questões políticas, pessoais, sociais, midiáticas, artísticas e filosóficas, todas elas se imbricam umas nas outras. Estruturalmente, há algo que parece conectar todas as cenas, repotencializando as imagens que foram se tornando cada vez mais triviais, de tão repetidas pela mídia no nosso cotidiano. Com uma maestria admirável, essas mesmas imagens são resgatadas da vala comum da banalização por uma operação singular: elas parecem associadas a obras visuais de uma maneira que Lia Rodrigues ainda não havia feito. Aqui, o encarnar se faz justamente nesse jogo de referências interlinguagens, que se encarna em uma dança, que sugere um quadro, que remete a uma performance, etc.
Há várias situações que fiam esse tecido espesso entre artes visuais e dança. Você pode escolher com qual Madona e o Menino quer ligar a cena da mãe com sua criança no colo (Amalia Lima e Ana Paula Kamozaki) e, nessa operação, vão aparecendo também as inúmeras fotos já vistas de mães carregando os cadáveres de seus filhos (Como a dor dos outros nos afeta?). Ou pode ligar o momento do punho erguido de Leonardo Nunes, com aquelas fotos de revolucionários de todos os tipos de ideologia, quanto com Lígia Clark - ela, uma presença a abençoar também os saquinhos de ketchup/sangue e creme de leite de Encarnado (Ainda é possível se aproximar do outro?).Quando Leo Nabuco, Gustavo Barros, Leonardo Nunes e Allyson Amaral se postam juntos, pode-se pensar no Os Cidadãos de Calais (1884-1886), a homenagem de Rodin aos habitantes da cidade de Calais que, em 1347, se entregaram como reféns ao rei Eduardo III, da Inglaterra, na esperança de que o cerco que lhes estava sendo imposto fosse suspenso. (A dança pode interferir nas desigualdades que pautam o Brasil?) E, no momento em que o sangue/ketchup começa a escorrer pelas costas de Celina Portella, assoma Ana Mendieta (Como a nossa própria dor nos afeta?)
É muito intrigante esse jogo entre imagens da mídia e das artes visuais que a habilidade de Lia Rodrigues materializa como dança. E quando se encarna na forma de dança, modifica também as metáforas que habitualmente associamos àquelas imagens. Trata-se de algo assemelhado a uma curiosa operação de translado que, ao levar de uma linguagem para outra, não transfere os significados.
O desempenho da companhia tem um papel central nesse entretecer. Os dois anos que separam a estréia no CND da estréia em São Paulo promoveram mudanças intensas. Não somente porque dois intérpretes-criadores deixaram a companhia (os excelentes Micheline Torres e Jamil Cardoso), mas sim porque os dez artistas que permanecem envolvidos chegaram a um tônus mais adequado ao tipo de não interpretação teatral que a obra pede. A intensidade que sublinhava cada ação foi substituída por uma desimpostação que permite que a violência forme poças de desconforto.
Cada qual marca a sua participação com muita propriedade. Destaca-se a maturidade de Ana Paula Kamozaki, o crescimento artístico de Allyson Amaral, o desabrochar de Leonardo Nunes, em meio à qualidade compartilhada por todos os intérpretes.
Fundada em 1990, a Lia Rodrigues Companhia de Dança foi convidada pelo Ceasm - Centro de Estudos e Ações Solidárias da Maré, em 2003, a tornar-se residente na Casa de Cultura da Maré. A ida para a Favela de Maré, um conjunto de comunidades populares, no Rio de Janeiro, que reúne cerca de 132 mil moradores, foi assumida como a experiência de colocar em convivência diária uma companhia profissional de dança contemporânea e uma instituição social. Uma estratégia que responde, de forma criativa e competente, ao que equivocadamente se reúne debaixo da etiqueta 'contrapartida social'. Trata-se de um ativismo exemplar, de amplo alcance, que já trouxe para a companhia três bailarinos e todo um outro entendimento de dança.
Encarnado, que já foi apresentado mais de 100 vezes em 11 países, não pode ser bem compreendido fora do ambiente no qual foi criado. Esse seu caráter de processo permanente carrega o dia a dia de quem vai descobrindo como conviver com tiroteios, bloqueios de rua promovidos por disputas entre facções inimigas, como compartilhar com uma arquitetura que trabalha com outra definição de espaço, como enfrentar o desafio de criar em um calor de 44º, como desvendar todo um outro código de comunicação.
Ao se inscrever no limite tão tênue entre a dor e o que causa a dor, desmantela qualquer possibilidade de vínculo causal entre ambas. Não à toa, está povoado de secreções e vísceras. Tendo como ponto de partida o livro Diante da Dor dos Outros, de Susan Sontag, Encarnado tem o mérito de nos fazer pensar sobre a extensão e a profundidade das dores que importam. Pena que a temporada se encerre já no domingo.
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