Impressionante como a cada performance vista durante esta Bienal Sesc de Dança o conceito desta arte e de movimento foi-se transformando em minha cabeça. O que vi, até agora, neste último dia de evento, só comprova essas mudanças.
Com Entre e Saia para as Entre Salas, da Cia. Etra de Dança Contemporânea, do Ceará, percebo que a dança não tem sotaque. A performance e a coreografia apresentadas pelos bailarinos do Nordeste têm as mesmas referências dos que vivem no Sudeste. Sintonia, sincronicidade?, como foi falado pela portuguesa Filipa Francisco no painel O Lugar da Dança.
Não sei responder. O que noto, pela Bienal, é que bailarinos e coreógrafos estão reiventando a dança, a roda. Novo choque ao assistir Pra Weidt - O Velho, apresentada pelo atelier de bailarinos santistas, que integrou lindamente jovens e idosos no mesmo palco, trocando de papéis, para lembrar-nos, como disse a colega Patrícia Andrik, de onde viemos e para onde vamos.
Assistindo depois ao painel sobre o processo de criação de Joana Lopes sobre a coreografia A Dança dos Velhos, de Jean Weidt, descubro que o que vi chama-se coreodramaturgia. É dança, teatro, movimento!
E Joana me fez pensar sobre o que um círculo, uma diagonal, uma horizontal podem comunicar e significar, linhas que Weidt e Joana souberam aproveitar em seus tempos e espaços. Nem foi preciso a coreografia quadrada e marcada para fazer o público refletir sobre o papel do idoso na sociedade e a fragilidade do ser humano de qualquer idade.
Outro conceito sobre dança me toma quando assisto a Dois do Seis de Setenta, da carioca Claudia Müller, a mesma que criou a dança contemporânea em domicílio. Assim como se entrega flores, Claudia leva arte para alguém, mas, além do presente em um embrulho diferente, ela chama para a questão da dificuldade do bailarino trabalhar e viver de seu trabalho, de seu corpo, de sua arte.
A mesma Claudia, criativa e desafiadora, questiona em Dois do Seis de Setenta o que é o corpo e de que matéria ele é construído. De marcas, como um mapa, diz o texto que acompanha a performance.
Com o corpo pintado com datas, ela vai se desenrolando no chão, mostrando as muitas possibilidades, as formas. E joga na cara do público que somos feitos de marcas, que levamos para onde formos e que contam nossa história, o machucado da infância, a vacina...
Se nosso corpo muda com o tempo, ganhando e perdendo marcas, só poderia ser desta forma com a dança. Acho que é bem isso que a quinta edição da Bienal Sesc de Dança está mostrando, as transformações pelas quais a dança está passando, as suas muitas possibilidades, a ausência de limites e a importância da história, para que não esqueçamos para onde seguir.
No último dia, percebo que o tema Memória que se Inscreve foi escolhido a dedo. Acredito que os bailarinos sairão daqui mais fortalecidos e mais inteiros de seu compromisso com a arte e com a sociedade, das mudanças que podem provocar com ou sem movimentos.
Fernanda Mello
Jornalista e comentarista do blog da Bienal Sesc de Dança
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